sábado, 26 de setembro de 2015

Volta e meia - parte 8


                Conheço o Flávio há uns 8 anos. Ele trabalhou no escritório por um tempo, trabalhava com registros e vivia indo correndo no cartório. Lembro de achar sexy nos dias de calor ele chegando suado com a camisa colada no corpo e o cabelo levemente molhado. Nunca foi fetichista pra essas coisas, mas o achava charmoso com ar de cansado.

                Ficamos amigos, mil interesses em comum, e saímos juntos algumas vezes quando eu sabia que minha casa estaria vazia porque o Matias estava de plantão. As saídas eram sempre em grupo, mas sempre me pareceu que tínhamos alguma ligação.

                Depois que ele saiu do escritório, nos aproximamos mais. Virtualmente no caso, ao vivo foram pouquíssimos os encontros ao longo de todos esses anos, e ele me deixou algumas mensagens amistosas quando minha crise com o Matias começou. Ou piorou.

                Durante um tempo tínhamos conversas picantes via internet. Fantasiávamos como transaríamos furiosamente na mesa da minha cozinha enquanto o Matias estivesse de plantão. Descrevíamos posições e até os palavrões que falaríamos. Nunca aconteceu de fato e ambos sabíamos que era apenas uma brincadeira. Logo depois da conversa (e provavelmente da masturbação de ambos) falávamos de mil assuntos aleatórios sem nenhum teor sexual.

                Naquele sábado, pouco mais de um mês sem Matias, sem sexo, sem desejo sexual, sem brinquedos, sem nada, eu finalmente relembrei que sou uma mulher saudável, independente, moderna, mente aberta e que sempre gostou de sexo. Eu lembrei que to viva.

                Matias era um canalha mas era realmente bom de cama. Foi meu único homem mas lembro de ouvir as amigas comentando que seus maridos não se esforçavam o bastante e que raramente atingiam o orgasmo enquanto eu conhecia a via láctea inteira de tanta estrela que via durando o orgasmo. Ele SABIA fazer uma mulher gozar. Talvez fosse exatamente por isso que todas queriam transar com ele e foi provavelmente esse sexo maravilhoso que me fez ser tão tolerante por tantos anos.

                Mas sexo não é tudo, por isso que em um dado momento nem a promessa de orgasmos até a morte foi o bastante pra continuar aceitando tudo o que é tipo de humilhação. Agora, pouco mais de um mês sem ele, é que eu percebi que teria que buscar outros meios de suprir essa falta.

                Lembrei do Flávio. Tá, admito, parece sacanagem eu nunca ter dado grandes margens para ele e agora lembrar dele por achar o meio mais fácil de ter sexo. Pensar em sair, conhecer algum estranho qualquer e etc me pareceu muito cansativo, o Flávio era uma solução mais fácil e prática. É isso que os homens fazem com as mulheres o tempo todo, não é? Por que diabos eu não poderia fazer o mesmo?

                Liguei pra ele, havíamos falando há poucos dias e sabia que ele estava solteiro, disponível.

                - Oi Flávio, Bianca.

                - Oi, Bia, tudo bem com você?

                - Sim, sim. Olha só, vou direto ao ponto. To afim de transar. – O silêncio foi realmente constrangedor, ele demorou quase um minuto pra reagir.

                - Comigo?

                - Se você topar, sim. Mas assim, isso não é o começo de nada, é só sexo, piupiu na pepeca, orgasmo, só isso.

                - Saquei. Onde você está?

                - Em casa. Perto da mesa da cozinha. – Ele gargalhou.

                - Chego aí em 10 minutos.

                E chegou. Eu estava descabelada, sem maquiagem, com camisetão de banda de rock dos anos 80, calcinha enorme e bege, depilação por fazer. A casa tava uma bagunça. Taquei o foda-se, se isso o fizesse broxar, não valeria mesmo ir até o fim, eu ainda era (sou) a Bianca das conversas picante.

                Ele não deu a mínima, já entrou me beijando. Não dissemos nem “oi” até ele tirar o preservativo do bolso, puxar minha calcinha e me penetrar ali, na mesa da cozinha. Ficou óbvio para mim que ele queria aquilo de verdade, que nossas conversas foram mesmo uma fantasia de tudo o que ele queria tornar real um dia.

                Matias se importava de me ver descabelada. Matias detestava pelos. Ver o Flávio passando a mão nas minhas pernas e sentindo os pelos não depilados e ainda me chamando de “linda” enquanto se preocupava em me dar prazer me fez perceber que talvez Matias, por melhor que fosse na cama, não era tudo o que eu lembrava dele.

                E eu gozei. Mais de uma vez. Na mesa, no sofá, na cama, no chuveiro. Flávio não dormiu comigo, sabia que aquele espaço era meu e que ele não tinha o direito de invadir. Sua “invasão” ficou restrita ao que eu permiti, ao que eu quis, ao que eu promovi. Foi embora tarde, mas foi. Não ligou no dia seguinte, e eu fiquei genuinamente feliz com isso. Na noite seguinte, quebrado o tabu da falta do marido, eu me toquei.

                Isso mesmo, me redescobri. Flávio me lembrou que havia um caminho de satisfação que não era do conhecimento exclusivo do Matias. Se o Flávio achou, eu podia achar também. E eu achei. Ali eu entendi que eu ainda me amava e me permitira me proporcionar prazer. Ali eu me senti mais completa na minha solidão.

                Ali, explorando meu corpo, minha alma e meu coração, eu sabia que estava pronta pra me sentir viva outra vez. 

continua...

domingo, 20 de setembro de 2015

Nem era tão importante

(Depois de um hiato provocado pela semana de provas da faculdade, estou de volta!)

Nem era tão importante

                Poderia dizer que fomos bem sucedidos, mesmo que não tenhamos exatamente tentado. Sabe aqueles lances muito... "nascemos um para o outro"? Mais ou menos assim só que nem tanto assim porque né, sei lá, a gente nem se amava pra valer.

                Tanto faz, na verdade, a gente nem queria mesmo, talvez por isso que deu certo. Quer dizer, deu certo naquelas, meio não dando porque né, a gente nem queria mesmo.

                Deu certo sim, sejamos honestos, perto de tanta gente por aí que batalha horrores para dar certo e logo a gente foi conseguir. E não, a gente não tentou, não mesmo, nem um tiquinho, tanto que quando a gente resolveu que não devíamos mais viver nosso relacionamento de sucesso, foi tudo super natural, tranquilo, nem chorei.

                Tá, até chorei um pouquinho, assim, só pra não parecer que não era legal, porque era. Foi pouco mesmo, uns 3 dias, com uma margem de erro de 15 dias pra cima, mas né, foi pouco, vai, tem gente que passa meses na fossa.

                Se valeu a pena? Ah, até valeu né? Porque mesmo que a gente nem tenha feito questão de nada, foi um tempo legal. Foi mesmo. Valeu mesmo. Mas a gente não queria assim de verdade. Não, não mesmo, era só pra gente se divertir um tantinho e a gente acabou se divertindo pra caramba.

                Mas né, a gente nem queria, por isso não insistimos, quando foi a hora de se separar, simplesmente nos separamos, sem traumas. Tá, foi um pouco traumático sim, pelo menos pra mim porque né, eu tinha recém mudado status do facebook e tive que mudar de volta como se a gente tivesse ficado junto por sei lá, umas 5h. E foram meses.

                Sim, foram meses de uma história que nenhum dos dois lutou pra ter mas nenhum dos dois parecia disposto a parar. Daí eu comecei a acreditar que a gente tava meio que se entendendo o bastante pra... ah por favor... eu tentei sim. Eu realmente tentei.

                Você arruinou meu coração e eu chorei feito louca quando você me disse que ah, nem era tão importante assim né?
                Era e doeu. Seu merdinha.

                

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Volta e meia - parte 7


                Hoje acordei sozinha. Talvez você possa pensar que não é nenhuma novidade, já tem quase um mês que o Matias foi embora, é óbvio que eu acordei sozinha. Mas hoje foi uma solidão diferente, mais aguda, dolorida mesmo.

                Matias era o legítimo canalha; me traiu tantas vezes que nem ele saberia contar. Me traiu com uma garotinha vulnerável e foi aí que meu coração não aceitou mais tanto chifre. Na real, ele aceitou, quem deu o basta foi o cérebro.

                De lá pra cá me tornei catatônica para o mundo pra poder sobreviver. Desde uma lamentação fúnebre pelo fim do meu casamento, até acusações de incompetência genital por não ter segurado aquele homem entre as pernas. Quando você encerra um relacionamento longo como o nosso, que se junta a um casamento do jeito que a sociedade gosta, todo mundo te julga.

                Casamos na igreja. Eu estava de branco, moça casta – ou pelo menos dizem que eu não tenho a tal cara de vadia que eu ouço gente chamando várias das minhas amigas. O casamento ideal, de deixar papai orgulhoso. Não o meu, né? Meu pai era o típico cidadão de bem, religioso, viril e um grandessíssimo filho da puta (com todo respeito às putas que não merecem tal comparação).

                E esse foi meu casamento: o homem provedor, macho, “gentleman”. Eu a moça pura, de família, casei sabendo cozinhar e exatamente que produto deixa o chão mais lustroso. Não casei virgem porque óbvio que Matias não esperaria a noite de núpcias pra me comer, mas eu realmente não fazia grandes questões de sexo antes do casamento.

                Matias foi meu primeiro homem. Eu havia namorado antes mas sexo mesmo, só com ele. Foram quase 10 anos de casamento e mais algum tempo de namoro e ele seguiu sendo meu único homem mesmo eu sabendo que toda vez que a gente transava, o pinto dele vinha de dentro de outra mulher.

                Aliás, isso foi uma coisa que quase me levou a entrar em parafuso, pensar que dentro de mim ele colocava um pouco de cada mulher com quem ele me traía. Eu as odiei por muito tempo, mudou tudo quando ouvi a voz da Analú, foi ali que eu entendi que essas mulheres apenas exerciam sua liberdade sexual, quem traía era ele, exclusivamente ele.

                Fiquei pensando nos discursos preconceituosos daqueles que juram defender a família quando esta se encaixa nos moldes que eles julgam ideal. Fiquei pensando o quanto minha família é vista por eles como sagrada quando eu tenho uma pilha de meios-irmãos que foram criados sem pai, quando vi o meu pai saindo de casa pra escolher com qual família tradicional sagrada ele iria ficar, quando vi minha mãe entrando em depressão porque ele destruiu a autoestima dela.

                Me dei conta que eu também poderia ter formado uma família sagrada. Não tivemos filhos mas éramos vistos como o casal ideal; um casamento tradicional com tudo o que a sociedade espera, e uma esposa em casa, com o jantar na mesa apenas esperando seu querido maridinho voltar do motel com uma das várias mulheres que ele seduz apenas para transar.

                Lembrei da Gê. A Gê é a moça corretíssima que defende sua aliança no dedo como a coisa mais linda e importante do mundo. A Gê é contra famílias não tradicionais, acha um absurdo que casais homossexuais queiram o mesmo status que seu casamento socialmente impecável. A Gê leva chifre todo dia. A Gê apanha do marido.

                Tá tudo errado com o mundo. Tá tudo errado com o meu coração. Me pego acordando num domingo com o coração sangrando de saudade de um canalha que me usou e me manipulou livremente. Me pego chorando, sofrendo, tendo que me segurar pra não ligar pra ele e pedir que volte pra mim.

                Não há nada mais doloroso do que amar genuinamente uma pessoa que não merece sequer nosso desprezo. Eu amo Matias, mas sou boa demais pra ele.

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Eu sei

Baby eu sei

Sei que nossos sonhos não ficaram para trás

Que nossas estrelas voltarão a brilhar

Que nosso destino e seguir

Caminhar

Baby eu sei

Que por mais que não tenhamos ido tão longe

Não havia melhor caminho do que aquele que fizemos

Que nenhuma história se compara com nossa

Mesmo que sequer tenhamos tido tempo

Baby, ah, eu sei

Eu sei que nossas almas são feitas de papel

Que escrevemos linhas das mais malucas vivências

Profundamente em algum cantinho nem tão escondido

Eu sei, baby

Que mesmo que a gente dê voltas e voltas

Mesmo que a gente ande sem jamais sair do lugar

Ainda teremos um ao outro pra rir de nossa desgraça

Baby eu sei

Que você jamais me deixou sozinha no escuro

Porque sabia que eu iria chorar

Que você segurou minha mão a cada estação

Sim, eu sabia que você estava lá

Porque baby, eu sei

Que a gente se amava.